quarta-feira, 11 de julho de 2012


SurdinaNo ar sossegado um sino canta, 
Um sino canta no ar sombrio... 
Pálida, Vênus se levanta... 
Que frio! 

Um sino canta. O campanário 
Longe, entre névoas, aparece... 
Sino, que cantas solitário, 
Que quer dizer a tua prece? 

Que frio! embuçam-se as colinas; 
Chora, correndo, a água do rio; 
E o céu se cobre de neblinas. 
Que frio! 

Ninguém... A estrada, ampla e silente, 
Sem caminhantes, adormece... 
Sino, que cantas docemente, 
Que quer dizer a tua prece? 

Que medo pânico me aperta 
O coração triste e vazio! 
Que esperas mais, alma deserta? 
Que frio! 

Já tanto amei! já sofri tanto! 
Olhos, por que inda estais molhados? 
Por que é que choro, a ouvir-te o canto, 
Sino que dobras a finados? 

Trevas, caí! que o dia é morto! 
Morre também, sonho erradio! 
A morte é o último conforto... 
Que frio! 

Pobres amores, sem destino, 
Soltos ao vento, e dizimados! 
Inda vos choro... E, como um sino, 
Meu coração dobra a finados. 

E com que mágoa o sino canta, 
No ar sossegado, no ar sombrio! 
- Pálida, Vênus se levanta. 
Que frio! 

Olavo Bilac, in "Poesias"

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