segunda-feira, 27 de agosto de 2012


A Terra Desolada (The Waste Land), de T.S. Eliot (1888-1965) – Nascido nos EUA, Eliot se sentia culturalmente ligado à Europa, tendo morado em Londres a maior parte da vida. Além de poeta, foi ensaísta e dramaturgo, tendo recebido o Nobel em 1948. No ano de 1922 publicou este poema-marco da literatura do século, em que constrói uma cerrada rede de referências à tradição literária européia na descrição de um continente devastado por um processo de desagregação que vinha desde o Renascimento.”Poesia”, trad. de Ivati Junqueira, Nova Fronteira.

O enterro dos mortos
Abril é o mais cruel dos meses, germina 
Lilases da terra morta, mistura 
Memória e desejo, aviva 
Agônicas raízes com a chuva da primavera. 
O inverno nos agasalhava, envolvendo 
A terra em neve deslembrada, nutrindo 
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida. 
O verão; nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee 
Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos 
E ao sol caminhamos pelas aléias de Hofgarten, 
Tomamos café, e por uma hora conversamos. 
Big gar keine Russin, stamm' aus Litauen, echt deutsch. 
Quando éramos crianças, na casa do arquiduque, 
Meu primo, ele convidou-me a passear de trenó. 
E eu tive medo. Disse-me ele, Maria, 
Maria, agarra-te firme. E encosta abaixo deslizamos. 
Nas montanhas, lá, onde livre te sentes. 
Leio muito à noite, e viajo para o sul durante o inverno. 
Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham 
Nessa imundície pedregosa? Filho do homem, 
Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces 
Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol, 
E as árvores mortas já não mais te abrigam, nem te consola o canto dos grilos, 
E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas 
Uma sombra medra sob esta rocha escarlate. 
(Chega-te à sombra desta rocha escarlate), 
E vou mostrar-te algo distinto 
De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece 
Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando; 
Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó. 
Frisch weht er Wind 
Der Heimat zu 
Mein Irisch Kind, 
Wo weilest du? 
''Um ano faz agora que os primeiros jacintos me deste; 
Chamavam-me a menina dos jacintos." 
- Mas ao voltarmos, tarde, do Jardim dos Jacintos, 
Teus braços cheios de jacintos e teus cabelos úmidos, não pude 
Falar, e meus olhos se enevoaram, eu não sabia 
Se vivo ou morto estava, e tudo ignorava 
Perplexo ante o coração da luz, o silêncio. 
Oed' und leer das Meer. 
Madame Sosostris, célebre vidente, 
Contraiu incurável resfriado; ainda assim, 
É conhecida como a mulher mais sábia da Europa, 
Com seu trêfego baralho. Esta aqui, disse ela, 
É tua carta, a do Marinheiro Fenício Afogado. 
(Estas são as pérolas que foram seus olhos. Olha!) 
Eis aqui Beladona, a Madona dos Rochedos, 
A Senhora das Situações. 
Aqui está o homem dos três bastões, e aqui a Roda da Fortuna, 
E aqui se vê o mercador zarolho, e esta carta, 
Que em branco vês, é algo que ele às costas leva, 
Mas que a mim proibiram-me de ver. Não acho 
O Enforcado. Receia morte por água. 
Vejo multidões que em círculos perambulam. 
Obrigada. Se encontrares, querido, a Senhora Equitone, 
Diz-lhe que eu mesma lhe entrego o horóscopo: 
Todo o cuidado é pouco nestes dias. 
Cidade irreal, 
Sob a fulva neblina de uma aurora de inverno, 
Fluía a multidão pela Ponte de Londres, eram tantos, 
Jamais pensei que a morte a tantos destruíra. 
Breves e entrecortados, os suspiros exalavam, 
E cada homem fincava o olhar adiante de seus pés. 
Galgava a colina e percorria a King William Street, 
Até onde Saint Mary Woolnoth marcava as horas 
Com um dobre surdo ao fim da nona badalada. 
Vi alguém que conhecia, e o fiz parar, aos gritos: "Stetson, 
Tu que estiveste comigo nas galeras de Mylae! 
O cadáver que plantaste ano passado em teu jardim 
Já começou a brotar? Dará flores este ano? 
Ou foi a imprevista geada que o perturbou em seu leito? 
Conserva o Cão à distância, esse amigo do homem, 
Ou ele virá com suas unhas outra vez desenterrá-lo! 
Tu! Hypocrite lecteur! - mon semblable -, mon frère
Trecho de ''Terra Desolada'', publicado pela Editora Nova Fronteira em ''T.S. Eliot - Poesia''.


Nenhum comentário:

Postar um comentário