Depomos nas mãos do leitor a mais moderna revista brasileira. Nossas
irmãs mais velhas nasceram por entre as demolições do Rio colonial, através de
cujos escombros a civilisação traçou a recta da Avenida Rio Branco: uma recta
entre o passado e o futuro. Cruzeiro encontra já, ao nascer, o
arranha-céo, a radiotelephonia e o correio aéreo: o esboço de um mundo novo no
Novo Mundo. Seu nome é o da constelação que, ha milhões incontaveis de annos,
scintila, aparentemente immovel, no céo austral, e o da nova moeda em que
resuscitará a circulação do ouro. Nome de luz e de opulencia , idealista e
realistico, synonymo de Brasil na linguagem da poesia e dos symbolos.
Timbre de
estrellas na bandeira da Patria, o cruzeiro foi, desde o primeiro dia da sua
historia, um talisman. Nas solidões do mar, era o fanal nocturno dos
navegantes. Vera Cruz, Santa Cruz, foram os nomes sacros que impuzeram á terra
nova os nautas-cavalleiros na semana mystica do descobrimento. A armada
descobridora apontara á vista dos íncolas attonitos, com as vermelhas cruzes
pintadas na pojadura palpitante das vélas. Na terra paradisíaca, por onde Eva
andava na verde floresta mais nua do que anda hoje nas praias fulvas de
Copacabana, arvorou-se em signal de posse uma cruz, em memoria daquella outra
em que um Homem divino fôra crucificado no reinado do lascivo Tiberio. Volvidos
quatro seculos, a bandeira nacional recolhia num losangulo de céo a constelação
tutelar, restaurando na linguagem dos symbolos o nome do baptísmo de
1500. Cruzeiro é um título que inclue nas suas tres syllabas
um programma de patriotismo.
ø
Uma
revista, como um jornal, terá de ter, forçosamente, um caracter e uma moral. De
um modo generico: princípios. Dessa obrigação não estão isentas as revistas que
se convencionou apelidar de frívolas. A funcção da revista ainda não foi, entre
nós, sufficientemente esclarecida e comprehendida. Em paíz da extensão
desconforme do Brasil, que é uma amalgama de nações com uma só alma, a revista
reune um complexo de possibilidades que, em certo sentido, rivalisam ou
ultrapassam as do jornal. O seu raio de acção é incomparavelmente mais amplo no
espaço e no tempo. Um jornal está adstricto ás vinte e quatro horas de sua
existencia diaria. Cada dia o jornal nasce e fenece, para renascer no dia
seguinte. É uma metamorphose consecutiva. O jornal de hontem é já um documento
fóra de circulação: um documento de archivo e de bibliotheca. O jornal dura um
dia. Essa existencia, tão intensa como breve, difficulta os grandes percursos.
É um vôo celere e curto. O jornal é a propria vida. A revista é já um compendio
da vida. A sua circulação não está confinada a uma area traçada por um compasso
cujo ponteiro movel raro pôde exceder um círculo de raio superior á distancia
maxima percorrivel em vinte e quattro horas. A revista circula desde o Amazonas
ao Rio Grande do Sul, infiltra-se por todos os municipios, utilisa na sua
expansão todos os meios de conducção terrestre, maritima, fluvial e aérea;
entra e permanece nos lares; é a leitura da familia e da visinhança. A revista
é o estado intermedio entre o jornal e o livro.
ø
Por isso
mesmo que o campo de acção da revista é mais vasto, a sua interpretação dos
acontecimentos deve subordinar-se a um criterio muito menos particularista do
que o do jornal. Um jornal póde ser um órgão de um partido, de uma facção, de
uma doutrina. Uma revista é ums instrumento de educação e de cultura: onde se
mostrar a virtude, animá-la; onde se ostentar a belleza, admirá-la; onde se
revelar o talento, applaudi-lo; onde se empenhar o progresso, secundá-lo. O
jornal dá-nos da vida a sua versão realista, no bem e no mal. A revista redu-la
á sua expressão educativa e esthetica. O concurso da imagem é nella um elemento
preponderante. A cooperação da gravura e do texto concede á revista o
privilegio de poder tornar-se obra de arte. A politica partidaria seria tao
incongruente numa revista do modelo de Cruzeiro como num tratado de
geometria. Uma revista deve ser como um espelho leal onde se reflecte a vida
nos seus aspectos edificantes, attraentes e instructivos. Uma revista deverá
ser, antes de tudo, uma escola de bom gosto.
ø
Porque é
a mais nova, Cruzeiro é a mais moderna das revistas. É este o
título que, entre todos, se empenhará por merecer e conservar: ser sempre a
mais moderna num paiz que cada dia se renova, em que o dia de hontem já mal
conhece o dia de amanhã; ser o espelho em que se reflectirá, em periodos
semanaes, a civilisação ascensional do Brasil, em todas as suas manifestações;
ser o commentario multiplo, instantaneo e fiel dessa viagem de uma nação para o
seu grandioso porvir; ser o documento registrador, o vasto annuncio illustrado,
o film de cada sete dias de um povo, eis o programma de Cruzeiro.
É pelo
habito de modelar o barro que se chega a bem esculpir o marmore. Esta revista
será mais perfeita, mais completa, mais moderna amanhã do que é hoje.
O Cruzeiro on line é um trabalho de preservação histórica do site Memória Viva
Nenhum comentário:
Postar um comentário